Bullying e suicídio III

05/10/2020

Como resultado desta revisão de literatura,  os achados deste estudo evidenciaram relação entre bullying e ideação suicida e/ou suicídio.  Quanto aos desenhos metodológicos, a maioria dos estudos (80%) foi do tipo transversal;  seguido de estudos de coorte (20%) . Todos utilizaram amostras de adolescentes e jovens, com idades variando entre 13 a 24 anos. Em termos de ano de publicação, dois dos estudos  foram realizados no ano de 2016. Entre os continentes de realização das pesquisas que originaram os artigos, predominou a América Latina com 3 artigos. Não foram encontradas publicações de origem brasileira. Cabe destacar que alguns estudos desta pesquisa têm apontado que ser vítima de bullying é um considerável fator de risco para o suicídio.


O objetivo deste estudo foi realizar uma revisão integrativa de literatura de artigos científicos sobre a associação entre bullying escolar e suicídio. Alguns autores verificaram que a vitimização por bullying foi associada a maiores probabilidades de consumo atual de tabaco; absenteísmo; luta física  e relações sexuais desprotegidas. Os resultados deste estudo sugerem ainda que adolescentes vítimas de bullying, além de apresentarem maiores chances de ideação e comportamento suicida, estão mais propensas a terem outros comportamentos que são potencialmente prejudiciais à saúde, como uso de tabaco e relação sexual desprotegida. Crianças e adolescentes que sofrem bullying podem ser afetados por diversos problemas de saúde, incluindo sintomas de doenças físicas e psicológicas. Em consequência das agressões sistemáticas sofridas, podem manifestar dores de cabeça, dores abdominais, insônia, enurese noturna, depressão, ansiedade, faltar à escola, diminuição da performance acadêmica, agressão a si próprio, pensamentos e tentativas de suicídio. Consequências que vão desde questões físicas, como também problemas de comportamentos internalizantes, como por exemplo: ansiedade, depressão, retraimento e medo. Em outro estudo verificou-se que processos de vitimização por bullying em grupo de adolescentes foram associados significativamente para a presença de ideias e pensamentos suicidas aumentando o risco de apresentá-los seis vezes mais. Um estudo na Pensilvânia confirmou associação entre bullying verbal, físico e cyberbullying com o risco de suicídio, no entanto, o bullying verbal foi associado exclusivamente com a tentativa de suicídio.



Tais autores, atestam para a severidade do bullying verbal no que se refere à tentativa de suicídio. Ratifica-se que existem diversos fatores predisponentes para o suicídio na infância e adolescência, segundo Sousa et al. (2017), concluíram por meio de uma revisão sistemática, que problemas escolares como o bullying e o rendimento escolar ruim, são considerados propensos para o suicídio na adolescência. Outro ponto destacado neste estudo é que adolescentes envolvidos em bullying apresentaram maior prevalência de automutilação e comportamento suicida em comparação com adolescentes não envolvidos (FORD et al., 2017). Em estudo empreendido por Guerreiro (2014) verificou que ser vítima de bullying é fator preditor de autolesão no sexo masculino. Nesta direção, estudos de Nylund et al. (2007) demonstram uma associação entre bullying e tristeza, desesperança, solidão, depressão, ansiedade, insônia e pensamentos suicidas. Deste modo, estabelecendo uma comparação com adolescentes envolvidos ou não com o bullying, infere-se que tal fenômeno poderá torna-se um fator de risco para o desenvolvimento de ideação e/ou comportamentos suicidas. Sobre este fato, Rivers e Noret (2013) concluíram em seu estudo que os estudantes que testemunharam o comportamento de bullying no ambiente escolar foram significativamente mais propensos do que aqueles não envolvidos no bullying para relatar sintomas de sensibilidade interpessoal, indicar desamparo e possível ideação suicida. Igualmente a estes dados, em uma pesquisa realizada no Reino Unido sugeriu que os estudantes que testemunharam o bullying poderiam apresentar consequências negativas, podendo manifestar aumento no consumo de álcool, depressão, ansiedade, além de pensamentos suicidas (RIVERS; POTEAT, et al., 2009). Outro estudo evidenciou que estudantes que possuem vários papéis no bullying apresentam mais probabilidades de relatar pensamentos suicidas do que aqueles que são apenas vítimas, agressores, espectadores ou aqueles que não estão envolvidos no comportamento de bullying (RIVERS; NORET, 2010). Percebe-se, assim, que tanto pessoas envolvidas diretamente no bullying (agressores e vítimas), como as testemunhas podem apresentar futuramente problemas de ordem psicológica, emocional, social. Outro ponto a ser destacado refere-se ao gênero, Gould et al. (1996) afirmam que em relação ao gênero, agressores e vítimas do sexo masculino são mais propensos a terem comportamentos suicidas do que aqueles que nunca estiveram envolvidos em bullying e as meninas que são vítimas de intimidações frequentemente são mais susceptíveis a efetuar o suicídio. Analisando isoladamente o bullying e o suicídio, verifica-se que pessoas do sexo masculino se envolvem com mais frequência em episódios de bullying comparado ao sexo feminino (MOURA, et al., 2011; RECH et al., 2013). Em relação ao suicídio, estudos revelam que os homens normalmente cometem mais suicídio, embora as mulheres tentem mais vezes do que os homens (VIDAL et al., 2013; REISDORFER et al., 2015). Em estudo realizado por Sandoval-Ato et al. (2018) com escolares, verificou-se que dos 289 escolares, 20% apresentaram risco suicida e algum tipo de depressão. Daqueles que estavam no topo da escala de bullying, 38% tiveram ideação suicida; por outro lado, daqueles que estavam deprimidos, 63% tinham ideação suicida. Verificou-se aumento da frequência de risco de suicídio com pontuação no terço superior para bullying (RPa: 1,83, IC 95%: 1,13-2,99, valor de p = 0,015), sendo deprimido (RPa: 3,32, IC 95%: 1,69-6,51; valor de p <0,001), a história familiar de suicídio (RPa: 1,99, IC 95%: 1,55-2,56; p <0,001), o desejo passivo de morrer (RPa: 2,20, IC 95%: 1,86-2,61, valor p <0,001), o planejou em algum momento o suicídio (RPa: 2,05, 95% IC: 1,60-2,64, valor p <0,001). Corroborando com o estudo anteriormente citado, alguns estudos têm apontado que existe uma associação entre bullying, tristeza, depressão e pensamentos suicidas (CARLYLE et al., 2007; KLOMEK et al., 2007). Em síntese, observava-se que o bullying impacta na saúde mental dos diferentes adolescentes presentes na escola, possuindo relação com a ideação suicida e ou suicídio. Os achados científicos desta revisão integrativa de literatura constituem-se aporte para o entendimento sobre a associação entre bullying e suicídio, o que poderá suscitar implicações nos diversos atores, seja da área da saúde, educação ou assistência social, no que se refere a propor ferramentas que sejam capazes de colaborar na formação e saúde mental de crianças e adolescentes. Em relação a formação e saúde mental de crianças e adolescentes, a inserção do psicólogo no ambiente escolar, torna-se um importante elemento, na mediação de conflitos, propondo momentos de diálogo e escuta na escola, visto que poderá contribuir com uma aprendizagem direcionada na reorientação das relações sociais, trabalhando aspectos tais como: cooperação, solidariedade, tolerância e respeito às diferenças individuais (FREIRE; AIRES, 2012; RAAB; DIAS, 2015). Além disso, o psicólogo poderá contribuir, nas atividades que possam auxiliar no desenvolvimento de fatores de proteção, dirigindo-se principalmente, para questões de resiliência que possam colaborar para o enfrentamento de situações prejudiciais, como por exemplo o bullying (GUZZO, 2011).

À vista disso, neste cenário, é indispensável que a abordagem do bullying seja priorizada na América Latina, sendo necessária um enfoque que inclua a promoção da saúde mental e física (ROMO et al., 2016). Cabe destacar, além disso, a importância da implementação de programas para identificar adolescentes de alto risco, como vítimas de intimidação sistemática e baseada em evidências a realização de intervenções, para reduzir o bullying nas escolas (FORD et al., 2017). Por fim, sugere-se a necessidade impreterível de aprofundar o estudo sobre o tema (VALADEZ et al., 2011).

Cássio Eduardo Soares Miranda - Psicanalista
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